*(COM SPOILERS SOBRE ACONTECIMENTOS DO FILME)



Disruptivo é uma palavra que, embora não seja habitualmente dita no português cotidiano aparece como mania de jornalistas e redatores que teimam em usa-la até a banalização de algo que, segundo o dicionário, deriva de “partir, despedaçar, rasgar, romper, destruir”, a ser usado para grandes mudanças. No entanto, falar de Star Wars em seu episódio VIII, “Os Últimos Jedi”, é obrigatoriamente associa-lo a uma grande mudança nos rumos da série de filmes.
Star Wars – Os Últimos Jedi é a continuação imediata de O Despertar da Força, seguindo mais uma vez a luta da Resistência comandada pela general Leia contra a Primeira Ordem de Snoke. Trocam-se os nomes dos grupos de poder (Aliança, Rebeldes, Império, República e tantos outros que já passaram pelos 7 filmes anteriores) mas a dinâmica ainda é a mesma: um pequeno mas valente grupo de pessoas lutando contra um poder ditatorial na galáxia. No entanto, nesta obra de 2017, dirigida pelo competente Rian Johnson (de Breaking Bad e Looper) o grupo dos mocinhos se reduz ao menor número de combatentes que já se viu em Star Wars e o lado sombrio, pela primeira vez, passa a ser liderado por um guerreiro Ex-Jedi, Kylo Ren que, numa cena surpreendente, mata o líder da Primeira Ordem. Começam aí as diferenças e os motivos para o episódio VIII ser um game changer.
No entanto, a mudança mais drástica na mitologia da série e que tem causado a revolta dos fãs de longa data dos filmes é a desmistificação dos Jedi. Através das falas de Luke Skywalker (Mark Hamil em sua melhor atuação em Star Wars) somos convidados a enxergar melhor a contribuição dos Jedis ao longo da história: praticamente nula. Uma Ordem vaidosa pelo poder da Força que esteve sempre além dos interesses da população e, quando lutou por liberdade foi para sua auto preservação – que se não falhou, chegou muito perto pois apenas Luke remanesceu. Além disso, a descoberta mais impactante e que alimentava teorias em fóruns e blogs foi a da real descendência de Rey: muito diferente do que se romantizava Rey não é filha de Luke ou Leia ou nenhum personagem heroico dos filmes, e sim de pessoas “comuns” e pobres que a venderam como mercadoria ainda na infância.
Uma das maiores místicas de Star Wars, a descendência Skywalker (Anakyn, Vader, Luke, Leia) como fonte de poder está desfeita. Tão importante é esta abordagem para seus realizadores que a cena final chega a ser redundante no tema ao mostrar uma criança qualquer num planeta desconhecido com indícios do poder da Força. Ocorre que o Último Jedi – como conhecíamos a Ordem – foi Luke, mas os Jedis ainda serão a força motriz da liberdade, porém vindos de classes sociais e locais distintos da galáxia, assim como Rey.
Fundamental também na construção deste novo capítulo é o personagem de Finn, que com bons diálogos e atuação de John Boyega, confirma um senso de heroísmo aliado ao humor e carisma diferentes de Han Solo (Harison Ford) mas igualmente importante para que o filme seja um bom entretenimento. Rian Johnson acerta também nos elementos de humor, vindos especialmente das criaturas da ilha onde Luke se refugiou e cria, nos porgs, por exemplo, tudo que George Lucas falhou com Jar Jar Banks. Outro ponto a se considerar no trabalho de Johnson é a preocupação estética: se em O Despertar da Força JJ Abrams preocupou-se mais em destacar o clima de ação e aventura em cenas de perseguição e fugas no espaço, Johnson dá atenção especial a montagem, como nas cenas que telepaticamente Kylo Ren e Rey conversam ou no design de produção, exemplificado pelo perfeccionismo da batalha nos campos de gelo e sal em que os veículos e armas deixam no seu rastro um impressionante mosaico vermelho no terreno.
O último e derradeiro elemento desta obra disruptiva é o fim da trilogia original (episódios IV, V e VI) nesta nova, marcado pela morte de Luke e Leia, esta última a ser antecipada devido ao falecimento da atriz Carrie Fischer em 2016. Ainda que Luke e Leia apareçam em flashes como Yoda neste episódio VIII, Star Wars não é mais uma terra dos Skywalker antigos ou dos egoístas Jedis de outra época ou das ações militares pela busca de poder sem considerar diretamente o impacto às pessoas comuns daquele mundo. É com essa mudança que Star Wars VIII pode ter desagradado fãs antigos mas ganhará as futuras gerações e permitirá a Disney a realização de mais episódios da saga.