A qualidade dos arranjos e sinfonias de Beethoven são uma unanimidade passados 250 anos de seu nascimento. Se ele é o símbolo do conceito “música clássica” nos dias atuais, sua popularidade sempre vem acompanhada da história de sua surdez e da vida difícil. Mas isto tudo já é fato histórico, atemporal. No entanto, uma das vertentes menos conhecidas da sua história e que pode (deve, na minha opinião) ser estendida a todas as vidas humanas é a capacidade de desempenhar papeis e concluir obras que destoam de uma tentadora conclusão lógica: produzimos e entregamos ao mundo aquilo que temos em nossa realidade.
Como exemplo, Beethoven, de vida difícil pela incapacidade auditiva precoce, infortúnios em relacionamentos amorosos e grandes tribulações familiares é o típico exemplo de um preconceito quase coletivo atualmente: o de que suas obras expressavam todas estas mazelas e dificuldades da sua vida. O erro deste enunciado reside no fato de que ao mesmo tempo em que compunha as sinfonias de caráter mais sombrios também compunha as mais alegres, que na onda do preconceito supracitado, não fariam sentido com a vida pessoal. Gênio? Certamente. Mas esta característica se estende a todos nós, que podemos produzir grandes obras que se dissociam da condição mais superficial de quem somos ou onde estamos, como as condições de posse material/econômicas, de saúde, de cansaço, de tragédias pessoais ou de alegrias pessoais. Mais do que isso tudo, há uma camada mais inerte e profunda que nos faz entregar ao mundo realizações – independente da forma – que podem não parecer fazer sentido a um olhar pouco atento. De onde vem a fonte de cada sentimento posto em forma de realização? Ou, melhor, somos tão escravos de sentimentos para poder pôr em prática nossas faculdades? As respostas à essas questões continuam em ebulição na minha mente; primordial mesmo é se libertar desta visão míope de causa e consequência.