O.J. Simpson – Made in America

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Dependendo da sua idade a simples citação do nome de O.J. Simpson pode trazer uma série de lembranças de manchetes de TV e jornais brasileiros e internacionais. Através dessa hipótese, O.J. – Made in America (2016), uma série documental da ESPN aborda em 5 episódios, totalizando 8 horas, a famigerada história norte americana do século XX: da ascensão ao declínio de uma das celebridades mais famosas no século passado, o jogador/superstar do futebol americano que foi comentarista de esportes, ator de Hollywood e empresário, O.J. Simpson.

Mesmo idealizada como uma série, a produção da ESPN vem figurando na maior parte das listas de melhores filmes do ano e é uma das favoritas a ganhar o Oscar de Melhor Documentário e, então inevitavelmente, questiona-se por que outras produções da ESPN (que seguem o mesmo formato) nunca foram reconhecidas de tal forma. No entanto, O.J. – Made in America é muito menos sobre O.J. que uma tradicional aventura biográfica pode sugerir e muito mais sobre o Made in America, particularmente sobre os Estados Unidos das décadas de 50 a 90.

Já no segundo episódio percebemos que a grande duração da obra será usada em prol de narrar o contexto social do país e de Los Angeles, das minorias e dos direitos civis. Assim, a personalidade de Orenthal James (ou, simplesmente, O.J.) é brilhantemente estudada frente a sua época e suas convicções políticas se tornam ainda mais assustadoras: O.J., mesmo negro, se omite de qualquer discussão sobre raça e sua fama e popularidade são em benefício próprio, para ganhar dinheiro e mais fama (seu principal combustível em toda a vida) desvinculando-se de lideranças dos direitos civis da época como Martin Luther King ou Muhammad Ali.

O carisma de O.J. persiste inabalável entre toda a população até 1994, quando sua ex esposa é assassinada e tudo indica que pelas mãos (literalmente) de O.J. Nasce daí a reta final da produção e um dos julgamentos em tribunais mais famosos da história. Num grande circo que durou cerca de 9 meses conhecemos uma vertente mais sórdida da justiça norte-americana, a da manipulação, do julgamento pela emoção e do preconceito (o julgamento em si é um estudo de caso melhor que qualquer série de ficção estilo Law and Order, por exemplo, pode roteirizar).

Neste momento toda a construção dos conflitos e tensões sociais e raciais apresentados funcionam como um recurso de pista-recompensa, isto é, a defesa dos advogados de O.J. se baseia numa hipotética perseguição racial dos brancos ao acusado e vai contextualizando, formando argumentação com a utilização todos exemplos anteriormente apresentados no documentário. É este o primeiro dos dois trunfos da série: todas as peças do quebra-cabeças são unidas para contar porque O.J. é uma personificação de um problema maior – séculos de violência e discriminação contra negros causaram danos a sociedade e o preconceito ainda está bem vivo. O.J., um ex astro e agora assassino, mesmo assim é idolatrado pelos negros pois representa uma oportunidade de “se vingar” dos brancos ao ser absolvido mesmo que injustamente. Além disso, ironicamente, são os negros (afinal, a maioria do júri é negra) que salvam O.J. da prisão, mesmo que ele sempre tenha negado a sua raça.

O segundo ponto principal da série é reforçar a importância que ser rico e famoso teve no desdobramento do julgamento de O.J. Em diversos momentos da série questiona-se se alguém de classe média ou não reconhecido publicamente conseguiria ser absolvido mesmo com todas as provas (DNA, inclusive) dizendo o oposto? A resposta é unânime: certamente não. Iria ser condenado.

Uma análise final nos leva a perceber que esses comportamentos em relação a exposição de pessoas na mídia e do preconceito racial nos dias atuais, não só persiste como se intensificou, por um lado pela oferta de anonimato fácil de grande alcance nas redes sociais e por outro pela degeneração econômica de muitas regiões (tanto dos EUA como do Brasil, para citar) que levou o mundo neste 2016 ao início de uma grande onda conservadora de Donald Trump’s espalhados por aí.

Por isso, O.J. – Made in America é um acerto no timming de sua realização neste fatídico ano de 2016 e, em última e definitiva análise, uma eloquente história de um país dividido pela cor da pele, mas unido pelo culto às celebridades.

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